A construção de uma estrada asfaltada, moderna para os padrões da década de 60, foi o que aproximou Salto, interior paulista, a cidade de origem de Hélio José Guilhardi, de Campinas, onde ele cursou a faculdade, na Pontifícia Universidade Católica (PUC).

A rodovia o levou mais longe do que é fisicamente possível: facilitou seu acesso ao curso de Psicologia e, assim, ao início de uma bela trajetória profissional e pessoal dedicada à Análise de Comportamento.

Hoje, aos 76 anos, Dr. Hélio é diretor do Instituto de Terapia por Contingências de Reforçamento, e professor de Especialização em Terapia por Contingências de Reforçamento, curso associado à Fundação Hermínio Ometo (FHO).

O entrevistado do mês é sócio emérito da ACBr e nos contou um pouco da sua história. Acompanhe!

ACBr: Qual a sua formação?

Dr. Hélio: Graduei-me em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Campinas, em 1969; iniciei a pós-graduação em Psicologia Experimental da USP, em 1970 e defendi minha tese de mestrado em 1975, sob orientação da Professora Doutora Maria Amélia Matos.

Em 1970, comecei minha atuação como professor na PUC de São Paulo e, na década de 80, fui contratado como professor na PUC Campinas. Considero minha carreira como professor universitário uma atividade que alavancou a qualidade conceitual e científica de minha formação.

Tornei-me Psicoterapeuta Comportamental em 1970, tendo sido um dos fundadores da primeira Clínica de Terapia Comportamental do Brasil em Campinas (SP).

A atividade acadêmica me colocou sob controle de uma comunidade que evoca e seleciona uma classe de comportamentos (ensinar, pesquisar etc.), enquanto a atividade clínica me colocou sob controle da comunidade do cliente e de seus familiares, que buscam alívio para seus sofrimentos.

Sinto-me privilegiado por ter sido beneficiado pela interação dessas duas comunidades, que possibilitaram meu desenvolvimento como profissional e como pessoa!

 

Por que escolheu PSICOLOGIA?

No início da década de 60, a formação acadêmica dos psicólogos estava no seu alvorecer. Despontavam alguns cursos de graduação em Psicologia e, neste contexto, a PUC-Campinas anunciou o início da turma dentro da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras, em 1965.

Eu morava em Salto (a 50 km de Campinas), recém-chegado de um intercâmbio realizado nos Estados Unidos, onde completei o Colegial. A construção de uma estrada asfaltada, moderna para os padrões da época, aproximou Salto, minha cidade de origem, de Campinas. Era a oportunidade para iniciar um curso universitário com baixo custo… Viajando diariamente, só me cabia pagar a mensalidade do curso!

Me pergunta, por que Psicologia?

Um amigo, João Serapião, fazia o Curso Normal. Naquela época, pode-se dizer, era um curso em nível colegial profissionalizante, que preparava jovens para serem professores para o que hoje é chamado de Ensino Fundamental 1.

O Curso Normal dava grande enfoque ao ensino da Psicologia e, assim, João teve íntimo contato com livros e textos psicológicos. Estava empolgado em se tornar psicólogo e me empolgou.

Emprestou-me um livro. O capítulo que li em primeiro lugar foi sobre Ivan Pavlov. Não consegui não me apaixonar pelos seus experimentos. Neste momento me convenci que era o meu caminho.

Pavlov me iluminou!

No Curso de Psicologia, mergulhei na Análise do Comportamento. Desde o segundo ano fui monitor dos cursos de Introdução à Análise do Comportamento (IAC) e me aprofundei nos fundamentos, por meio dos livros de Keller-Schoenfeld, Skinner, Holland-Skinner.

Minha imersão no mundo operante foi privilegiada; para mim a Psicologia passou a ser uma Ciência Natural, mais especificamente a Ciência do Comportamento.

“Considero minha carreira como professor universitário uma atividade que alavancou a qualidade conceitual e científica de minha formação”

 

Qual a sua avaliação sobre sua carreira ao longo desses anos?

Faço uma avaliação muito positiva da minha vida profissional. Sinto-me realizado e acredito ter acumulado significativo legado para a Análise do Comportamento e para o Behaviorismo Radical.

Meu trabalho, por cerca de 20 anos, em curso de especialização focada em Terapia Comportamental evocou e selecionou amplo desenvolvimento de meu repertório como professor, pesquisador e psicoterapeuta.

Se tivesse que recomeçar minha vida seguiria a mesma trilha!

 

Quais principais desafios e realizações?

O principal desafio foi lidar com a resistência da comunidade mentalista à introdução de um novo modelo funcionalista e externalista – monista empírico, enfim – no ensino da Análise do Comportamento, do Behaviorismo Radical e da Terapia Comportamental.

O novo paradigma conceitual do Homo sapiens e as práticas de análise e intervenção com os comportamentos humanos despertaram animosidades e incompreensões que, muito lentamente, avançaram para uma acomodação respeitosa.

Outra dificuldade não teve a ver com as abordagens estruturalistas, mecanicistas, internalistas, mas com a intromissão no campo da Análise Comportamental Operante de práticas e conceituações comportamentais, que ferem os fundamentos da Ciência do Comportamento. Assim, as Terapias Cognitivo-comportamentais adotam modelo mentalista de compreensão dos comportamentos humanos.

Induzidos a erros de interpretação e desconhecimento do desenvolvimento histórico da Terapia Comportamental Operante, espantoso número de Analistas de Comportamento, não entende que as ondas da Terapia Comportamental é uma sistematização arbitrária, proposta por Hayes, das Terapias Comportamentais Cognitivas (nada têm a ver com o desenvolvimento dos modelos psicoterapêuticos operantes).

O uso do termo comportamento serve a diversas concepções psicoterapêuticas irreconciliáveis (erroneamente chamadas de terapias comportamentais), mas que, desta forma, camufla as diferenças conceituais e as práticas clínicas que delas derivam.

As realizações são o desenvolvimento da Análise do Comportamento como Ciência e como prestadora de serviços à comunidade. Também o desenvolvimento de uma prática psicoterapêutica essencialmente comprometida com a Análise Experimental e Aplicada do Comportamento e com o Behaviorismo Radical, da qual a Terapia por Contingências de Reforçamento (TCR) – por mim sistematizada, ampliada e difundida – é um encorajador exemplo.

A consolidação das práticas psicoterapêuticas operantes confirma princípios e dados experimentais e, por outro lado, estimula a revisão e ampliação de conceitos e oferece termas para pesquisa.

 

 

E sobre a ACBr: qual a sua relação com a Associação?

A ACBr é uma Associação em prol do desenvolvimento, divulgação e aglutinação daqueles que têm expectativas de levar à consolidação da prática das Ciências Naturais dentro da Psicologia e de prestação de serviços baseados em evidências empíricas, experimental e conceitualmente sistemáticas.

Seu papel aglutinador e evocador deve ser reconhecido e valorizado!